Simão Salvador, da ilha de Santo Antão, o herói no Brasil escravocrata do sec. XIX, agora em Banda Desenhada
Simão Manuel Alves Juliano (1824 - 1856), natural da Penha de França, na ilha de Santo Antão tornou herói no Brasil escravocrata da década de 1850, depois de salvar 13 pessoas, após um naufrágio de um vapor. A Embaixada do Brasil em Cabo Verde apresentou na passada 14 de agosto, na ilha de Santo Antão, em Banda Desenhada, a vida e obra do intrépido marinheiro Simão. Um trabalho com assinatura de Gildaris Pandim (roteiro) e Alex Sander (arte).
Com o feito heróico Simão Juliano passou a ser conhecido por Simão Salvador. A sua valentia valeu-lhe uma homenagem do então Imperador do Brasil, D.Pedro II, com medalha de ouro. A figura de Simão Salvador é destaque na fachada da Embaixada do Brasil em Cabo Verde, como símbolo de amizade que unem os dois países. No Museu Nacional de Belas Artes, no Rio de Janeiro, existe uma tela, 93 x 72,6 cm, "Retrato do intrépido marinheiro Simão", de autoria do pintor e académico, José Correia de Lima.
Simão Juliano, emigrou para Brasil para trabalhar como marinheiro, no primeiro ciclo de migração cabo-verdiana no século XIX. No país em que a escravatura era pratica legal, Simão foi um negro africano livre. Trabalhava como marinheiro a bordo do vapor «Pernambucana», que transportava pessoas e cargas em viagens entre Rio Grande do Sul para o Rio de Janeiro. No dia 8 de Outubro de 1853, o navio naufragou durante uma tempestade, próximo do Cabo de Santa Marta.
O ato heróico Simão Salvador
O antropólogo e investigador, caboverdiano, Brito-Semedo, no seu blog Esquina do Tempo, descreve de forma empolgante o feito heróico de Simão: "Toda a esperança de salvação tinha-se perdido. O quadro que se oferecia a bordo era desolador. No vapor não havia os socorros precisos e de terra não podiam ser enviados. As ondas encapeladas envolviam o navio e a cada nova golfada do mar mais uma vida era perdida. As dezenas de passageiros que se agarravam uns aos outros sobre a coberta imploravam a salvação, mas inutilmente, porque a morte vinha rápida surpreendê-los, sem que os auxílios de terra pudessem ser prestados. Logo que o navio encalhara, um homem mais arrojado que todos os outros conseguiu salvar-se a nado. Esse homem era o nosso Simão Juliano.
Desprezando a vida que havia já salvo, Simão lançou-se outra vez à água e nadou para o navio. O espaço que tinha a percorrer media talvez 100 metros e o intrépido marinheiro venceu esta distância à força de coragem e de energia e voltou à praia salvando um dos passageiros. Depois desta vítima salvou outra, outra e outra. Dez vezes se lançou ao mar e dez vezes conseguiu voltar à praia trazendo sempre agarrado um dos pobres náufragos. As forças estavam exaustas. O corpo cedeu à fadiga e o valente marinheiro, prostrado e abatido, caiu por terra.
A bordo do navio ainda restavam alguns desgraçados para quem a última esperança se perdia de todo. Na praia, havia uma pobre mulher que chorava, lembrando-se de dois filhos que ainda estavam a bordo. Ela dirigiu-se a Simão com os olhos arrasados de lágrimas e a voz embargada pelos soluços e apontou-lhe o navio. O valente atleta que lutara já duas vezes com o oceano enfurecido, lembra-se dos seus e de sua mãe, levantou-se e investiu com as ondas. Todos os espectadores estremeceram percebendo que a luta ia ser desesperada, mas momentos depois voltava trazendo mais um náufrago.
A mulher tinha outro filho que era preciso salvar e Simão lá voltou ao navio e pouco depois aparecia na praia entregando à mãe a segunda criança.
Já nada parecia restar a bordo. Os outros tripulantes e passageiros tinham sido devorados pelo oceano revolto. O navio, meio despedaçado, soçobrava sempre e estava prestes a afundar-se. De súbito, ouve-se um grito aflitivo. Era dado por um cego que ainda existia a bordo e de quem todos se haviam esquecido.
Simão olhou ainda outra vez para o mar, escutou os gritos de angústia que se soltavam em torno dele e precipitou-se no meio das ondas. Simão voltou são e salvo trazendo consigo o pobre cego. Ainda os dois não tinham chegado à praia e já o navio desaparecera de todo. Perto de cem pessoas haviam perecido nessa imensa catástrofe e as treze que tinham escapado deviam a existência ao nosso herói!."
O relato minucioso do acto heróico de Simão foi noticia por todo Brasil e na Europa. Foi condecorado por altas autoridades de Brasil e Portugal. Foi muito requisitado por grandes pintores da época para o retrato de uma figura que impôs pela sua coragem.
Depois das homenagens Simão Salvador regressou para sua terra natal. Faleceu pouco tempo depois, aos 32 anos, em Ponta do Sol, ilha de Santo Antão.